Crônica
Invisibilidade
Chelsea Karina de Brito
— O senhor não pode entrar.
O segurança tinha uma expressão séria, mas não esboçava nenhum sentimento de raiva ou rancor.
— Eu tenho o dinheiro necessário, consegue ver? Aqui está!
O homem mostrou um punhado de notas amassadas.
— Esse lugar não pertence a pessoas como você! Saia!
— Pessoas como…eu?
Saiu para o lado da calçada e deixou a passagem livre para os casais que aguardavam. O olhavam com desdém, sequer miravam seus olhos. A vista só enxergava a marca que carregava na pele, um corte que vinha da orelha até metade da boca, partindo para o lábio superior. Pessoas como eu, mas o que significa? Pensou.
Ao seu redor, viu que os que o encaravam, assim como ele, carregavam cicatrizes. Em devaneios, percebeu uma mulher e um homem. Um coração partido, pobrezinha! E ele…bom, ela não deveria estar acompanhada de alguém com marcas de tamanha agressividade.
— Senhor, saia! Está atrapalhando a entrada.
Balbuciou o segurança.
Os olhares tortos não foram suficientes para amenizar a expressão de pena do homem. Quantas marcas! Quantas cicatrizes! Dor, vergonha, ódio, tristeza, solidão, luto… e todas expostas. Mas ninguém as via, somente ele. Um por um, passou pela porta, sem problemas, sem objeções. Desistiu de entrar, seguiu pela noite vazia, olhou para o céu e disse:
— Ao menos, as minhas cicatrizes são somente superficiais.